A reforma tributária e seus impactos nas holdings imobiliárias.

De antemão, é importante esclarecer que de acordo com o IBGE, responsável pela Classificação Nacional de Atividades Econômicas (CNAE), a atividade de holding refere-se a participação de uma sociedade em outras empresas e não em negócios imobiliários. No entanto, a prática de mercado consolidou o uso do termo “Holding Imobiliária” para designar sociedades cujas atividades principais são a (i) compra e venda e a (ii) locação de imóveis próprios. Sendo assim, para fins didáticos, neste artigo utilizaremos a expressão Holding Imobiliária para nos referirmos a essas sociedades.

Pois bem, a reforma consolidada na Lei Complementar 214/25, fruto do PLP 68/2024, promoveu uma transformação significativa no sistema tributário brasileiro. Isto posto, este artigo visa explicar, de maneira clara e acessível, como as mudanças tributárias recém aprovadas impactarão as holdings imobiliárias.

Contexto Atual das Holdings Imobiliárias

Tradicionalmente as holdings imobiliárias optam pelo regime tributário do lucro presumido por sua simplicidade e por oferecer uma tributação reduzida quando comparada ao regime de lucro real – a atividade imobiliária de imóveis próprios não pode ser tributada no Simples Nacional. Empresas deste tipo, frequentemente, não possuem despesas dedutíveis relevantes, o que torna o lucro presumido uma escolha lógica e vantajosa.

Atualmente, a alíquota efetiva – soma das alíquotas de IRPJ, CSLL, PIS e COFINS – para a atividade de locação é de máximo 14,53%, considerando o adicional de IRPJ aplicável a empresas que faturam mais de R$ 240.000,00. Sem este adicional, a alíquota efetiva é de 11,33%. Para a compra e venda, a alíquota efetiva máxima é de 6,73% considerando o adicional de IRPJ.

O Que Muda com a Reforma Tributária?

Com a reforma tributária, o PIS/COFINS será substituído pela Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), e o ICMS/ISSQN dará lugar ao Imposto sobre Bens e Serviços (IBS). Estes dois tributos, CBS e IBS, compõem o chamado IVA Dual, cuja alíquota padrão conjunta ainda será definida, embora projeções atuais apontem para um percentual próximo de 28%, embora a legislação estabeleça um teto máximo de 26,5%.

A propósito, sobre o tema, o secretário extraordinário da reforma tributária, Bernard Appy, afirmou que “A projeção dos dados que temos hoje apontam para alíquota (do IVA) de 28%. Não quer dizer que será essa”.

Fato é que a alíquota final conjunta do IBS e da CBS ainda não foi definida, o que traz incerteza quanto ao impacto exato na carga tributária das operações das holdings imobiliárias.

Apesar disso, a Lei Complementar 214/25 já trouxe diretrizes claras sobre como será realizada a tributação das atividades imobiliárias.

Contribuinte

Diferentemente do que ocorria com os tributos sobre o consumo antecessores (PIS e COFINS), as pessoas físicas que realizarem atividades de locação, cessão onerosa, arrendamento e alienação de imóveis próprios, poderão ser tributadas pelo IBS e da CBS, desde que, ultrapassem determinados limites quantitativos de faturamento e operações imobiliárias. Ou seja, por praticarem negócios jurídicos em quantidades semelhantes às práticas empresariais, essas pessoas físicas poderão ter suas receitas imobiliárias tributadas pelo IBS e pela CBS, bem como pelo Imposto de Renda da Pessoa Física (IRPF), o que representa um considerável aumento de carga tributária.  

Base de Cálculo e Redutor de Ajuste

Um tributo é composto por três elementos essenciais: base de cálculo, alíquota e fato gerador.

Nada obstante a Lei Complementar 214/25 ainda não tenha fixado a alíquota conjunta final dos novos tributos, ela já estabeleceu de forma clara a base de cálculo aplicável às operações imobiliárias, o que permite antecipar cenários futuros de tributação e planejar adequadamente as atividades das holdings imobiliárias.

Neste ponto, a nova legislação introduziu mecanismos que visam atenuar a carga tributária sobre os negócios imobiliários, especialmente aqueles relacionados à compra e venda de imóveis próprios.

Dentre esses expedientes, destaca-se o Redutor de Ajuste, que permite ao contribuinte do IBS e da CBS deduzir da base de cálculo certos valores, como o custo de aquisição do imóvel e, em alguns casos, o valor do ITBI e laudêmio pagos. Desta forma, os novos tributos incidirão sobre o valor agregado da venda do imóvel, isto é, apenas sobre o montante que exceder o custo de aquisição do bem, mantendo assim a coerência com o princípio da não cumulatividade que vigora no sistema do ICMS atual.

Além disso, em determinadas situações, o custo do imóvel alienado poderá ser atualizado monetariamente pelo IPCA, o que contribui para redução da base de cálculo dos tributos, garantindo maior justiça fiscal para operações de longo prazo.

Ainda, a legislação prevê um mecanismo específico para operações que envolvem imóveis residenciais, denominado Redutor Social. Este redutor permite uma dedução adicional na base de cálculo do IBS e da CBS, tanto na locação como na compra e venda, visando minimizar o impacto tributário sobre negócios imobiliários que atendem, principalmente, a população de baixa renda.

Impactos nas Holdings Imobiliárias

            Em seguida, mesmo não definindo a alíquota conjunta final do IBS e da CBS, a LC 214/25 trouxe benefício fiscal relevante para o setor imobiliário. Isto porque, a nova legislação estabeleceu que a alíquota conjunta efetiva dos novos tributos, qualquer que seja ela, será reduzida em 50% para as operações de compra e venda e em 70% para os negócios jurídicos de locação.

Essa estrutura diferenciada busca aliviar o impacto tributário sobre as atividades imobiliárias e estimular o desenvolvimento do setor que é um dos pilares da economia brasileira.

Então, considerando o teto previsto em lei para a alíquota conjunta do IBS e da CBS, qual seja, 26,5%, a aplicação da redução de alíquota resultaria em tributação significativamente menor para os negócios jurídicos imobiliários.

 

Diante disso, somando-se as alíquotas de IPRJ e CSLL do lucro presumido, as operações de locação passariam a ter uma alíquota efetiva máxima de 18,83%, enquanto as operações de compra e venda seriam tributadas no máximo em 16,33%, ambas considerando o adicional de IRPJ.

Conclusão

As alterações da Lei Complementar 214/25 impõe um desafio significativo às holdings imobiliárias, exigindo planejamento tributário criterioso e contínuo.

Embora a alíquota final conjunta do IVA Dual ainda não esteja definida, as novas regras indicam um aumento expressivo da carga tributária, especialmente, para operações de locação.

Por outro lado, os negócios jurídicos de alienação de imóveis poderão se beneficiar de uma redução na base de cálculo destes tributos, ainda que acompanhada por um aumento na alíquota, proporcionando um cenário mais equilibrado para essas operações.

Por fim, uma eventual reforma sobre a tributação da renda, aplicada a pessoas físicas e jurídicas, durante o período de transição do IBS e da CBS, pode contribuir para reduzir a alíquota conjunta desses tributos e/ou criar/manter um ambiente mais favorável à tributação das pessoas jurídicas no setor imobiliário.

ADRIANO MUNIZ GARCIA

Advogado sênior do CQAA Advogados Associados, graduado em Direito pela Universidade Federal de Minas Gerais, pós-graduado em Direito Tributário pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC Minas), possuí LL.M em Direito Empresarial pelo IBMEC, e atua nos ramos do Direito Societário e Tributário.